Como a Sua natureza essencial é incompreensível e está oculta à inteligência humana, Ele gravou em cada uma de Suas obras certos sinais da Sua gloriosa majestade, pelos quais Ele se dá a conhecer segundo a nossa diminuta capacidade. Digo que são sinais tão notórios e evidentes que nem mesmo os mais cegos e os mais rudes do mundo podem alegar ignorância. Porque, embora a Sua essência nos esteja oculta, não é assim com as Suas virtudes, as quais se mostram constantemente aos nossos olhos e de tal modo O revelam que nos servem de meios para conhecê-lo para a nossa salvação.
Em primeiro lugar, para onde quer que voltemos os olhos, não há o mais diminuto rincão do mundo em que não refulja ao menos alguma centelha da glória de Deus. Realmente, ninguém pode de um relance contemplar a belíssima obra de arte universal em sua vasta amplitude e extensão, sem ficar, por assim dizer, estupefato ante a incomensurável riqueza do seu esplendor. Por isso o apóstolo que escreveu Hebreus com muita propriedade chamou aos séculos espelhos das realidades invisíveis, pois o mundo foi composto para servir-nos de espelho para podermos contemplar a deus, que, de outro modo, nos seria invisível.
Pela mesma razão o profeta atribui às criaturas chamadas corpos celestes uma linguagem que se faz conhecida a todas as nações, porquanto há nelas um testemunho tão evidente da divindade que não pode ser ignorado, nem mesmo pelos mais rudes e mais atrasados. Sobre isso Paulo, expondo o assunto com maior franqueza, diz: “... o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das cousas que foram criadas”.
No céu e na terra há incontáveis demonstrações da maravilhosa sabedoria de Deus. Não me refiro apenas às que são difíceis de compreender, cujo entendimento só se pode obter por meio do conhecimento de astronomia, medicina e física, mas principalmente as que são fáceis de ver até para os mais simples e ignorantes, a tal ponto que basta que abram os olhos para se verem forçados a dar testemunho delas. É bem verdade que os que receberam instrução sobre as artes liberais, ou que provaram algo delas, têm nesse conhecimento uma ajuda especial para aprofundar-se nos segredos da sabedoria divina. Contudo, mesmo aquele que desconhece essas artes não é impedido de ver grande parte das obras de Deus, sendo levado a admirar o Artífice que as criou.
A modo de exemplo, é necessário ter arte e habilidade especiais para estudar os movimentos dos astros, para distribuí-los em suas respectivas posições, para calcular as distâncias e observar as propriedades de cada um deles. (Por essa consideração, tendo-se em conta que por essas coisas a providência de Deus se mostra com mais clareza, ainda mais alto deve elevar-se a nossa alma na contemplação da glória divina.) Entretanto, como nem as pessoas que só têm como recurso os seus olhos podem ignorar a excelência da sabedoria divina, que se revela na variedade de corpos celestes, incontáveis e harmoniosamente ordenados, certo é que não existe ninguém a quem Deus não manifeste suficientemente a Sua sabedoria.
Paralelamente, estudar, com a aplicação que nesse empenho Galeno demonstra, a constituição do corpo humano, em que se notam inter-relação, proporção, beleza e funções, leva à conclusão de que essa obra só pode ter sido realizada com grande habilidade e sabedoria. E, como todos em geral reconhecem, o corpo humano tem uma constituição tão engenhosa que dá ao seu Artífice o merecimento da nossa maior admiração.
Quantos exemplos mais serão necessários para levar os homens à consideração do poder de Deus? Pois de outro modo não se pode agir, se não é que ignoramos o grande poder de Deus, que sustenta a imensa grandeza do céu e da terra unicamente por Sua palavra, capaz de, a Seu comando, fazer tremer o céu com os Seus trovões, acender a seu bel-prazer os raios, inflamar os ares com os Seus relâmpagos, inundar o mundo com diferentes tipos de tempestades; e, subitamente, quando Lhe parece bem, restabelecer a bonança e a tranqüilidade; igualmente pode manter o mar de tal modo suspenso que não possa causar dano à terra, como também, pela altura de suas ondas, ameaça destruí-la, mantendo-se numa terrível agitação pela grande impetuosidade dos ventos; e, de repente, pode apaziguar as suas vagas e serená-lo. Este Seu poder deve levar-nos a considerá-lo necessariamente eterno, tendo Seu princípio em Si mesmo, e de Quem todas as coisas têm a sua origem.
Além disso, se for procurada a causa que O induziu a criar no princípio todas as coisas e agora O movem a conservá-las, não a encontrará senão em Sua bondade, a qual, mesmo não havendo outro motivo, deverá ser mais que suficiente para atrair o nosso amor. Sim, pois, como nos ensina o profeta, não há nenhuma criatura sobre a qual Deus não tenha derramado a Sua misericórdia.
11º Tese de Lutero - Essa erva daninha de transformar a pena canônica em pena do purgatório parece ter sido semeada enquanto os bispos certamente dormiam.
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